Art DM: Quero ser mais ou menos

[cardoso]

Desde que ocupo este espaço no Diário do Minho tenho procurado mostrar que o futebol é um microcosmo da vida; um ambiente que espelha as alegrias e tristezas, angustias e paixões que não são do futebol, são da vida, são do homem.
O adepto que grita desesperado pelos erros que vê no trabalho do árbitro não levanta a voz do clube; ergue o grito da sua raiva, que é da sua vida, que é do seu mundo. Um mundo todo; é uma alma inteira que se expressa naquela voz.
Quando um adepto festeja a vitória, não são as cores do clube que o fazem vibrar nem os pontos do triunfo; é o alívio de todos os sofrimentos do seu mundo que ali, naquela hora, exala pela voz e pelos poros.
O futebol não é, nunca foi, nem nunca será um "entre parêntesis" na vida. Nem é um mundo além do real, uma esfera de vidro ou uma ilha na nossa existência. É parte integrante do todo imenso que é cada um de nós.
E o futebol, como o mundo, é feito de grandes figuras, ídolos, cromos nos quais depositamos as esperanças de todas as redenções e em quem, por vezes, materializamos as nossas desilusões e tristezas. Aos primeiros veneramo-los como heróis, aos segundos dedicamos a nossa mais refinada raiva.
O mundo do futebol é, visto assim, um turbilhão de sentimentos, um universo de emoções essenciais. É, ao fim e ao cabo, uma projecção do todo imenso que reside em cada um de nós.
E no meio de todos estes remoinhos emocionais, onde fica a racionalidade? Não fica! O nosso brilhante António Damásio tem lutado incansavelmente por atribuir uma carga racional a todos os nossos sentimentos e emoções. Eu cada vez mais me convenço do contrário; ao longo de uma vida toda, quantas vezes conseguimos ser apenas racionais? Se no futebol fossemos apenas racionais não haveria heróis, nem árbitros merecedores de requintados tratamentos, nem sequer teríamos direito àquelas acaloradas discussões de segunda-feira. Em suma, que fastiento seria o futebol; que enfadonha seria a vida!
É por isso que eu gosto de Scolari. Porque aquilo é só emoção; é sentimento em estado cristalino. É fúria, é raiva, é alegria, é paixão... é o homo futebolis na sua mais pura condição. É claro que o homem, mais uma vez, passou das marcas. Quebrou as regras da sensatez. Mas, meus amigos, nomeiem-me uma só pessoa que no mundo do futebol nunca tenha quebrado as regras da sensatez. Também vos digo que se essa pessoa existir deve ser um grande chato.
Tudo isto é muito bonito: emoções à flor da pele, alegria, catarse, paixão. Mas... e se temperássemos isto com um pouquinho da tal racionalidade? Todos sabemos que há os maus e os bons, os incompetentes e os competentes. Mas... e não há os "mais ou menos"? Não haverá vários tons de cinzento? Não há bons que fazem asneiras e maus que têm assomos de inteligência? Talvez o que falte ao futebol seja mesmo isto: que nos deixemos levar um pouco mais pelas teorias do A. Damásio. Que acreditemos que há meios-termos; que podemos admirar algumas pessoas mas também criticar alguns dos seus actos. Talvez o Scolari tenha qualidades. Talvez António Salvador também erre. Por acreditar nisso é que eu ontem não iria ver o Braga-Bayern, mesmo que as obrigações profissionais não me tivessem impedido.

[Zé]

O futebol não é, nunca foi, nem nunca será um "entre parêntesis" na vida. Nem é um mundo além do real, uma esfera de vidro ou uma ilha na nossa existência. É parte integrante do todo imenso que é cada um de nós.

Cada vez mais, vejo pessoas a irem a um jogo, não porque gostem de futebol. Porque gostem de uma equipa. Porque gostam da atmosfera envolvente.
Vejo cada vez mais, pessoas a irem a um jogo porque é um local in... porque está na moda.

Será que para estes, o futebol não é um entre parêntesis?

O futebol está a perder o espírito original. O desporto que era das multidões, está, aos poucos, devagar, mas com firmeza, a virar um desporto de elites. As elites que não vibram, que não gritam, que não partem cadeiras, que não sentem, que não choram nem riem...
Parece um paradoxo, mas a pressão das multidões que acima enunciei, está a empurrar para o elitismo.

[Nemec]

Vejo cada vez mais, pessoas a irem a um jogo porque é um local in... porque está na moda.

Será que para estes, o futebol não é um entre parêntesis?

Pegando nesta parte e trazendo-a para a realidade do nosso clube, o futuro poderá não ser tão brilhante no que a assistências aos jogos e fanatismo se refere!
Recuando um pouco no tempo, nos últimos anos que o Braga teve como casa o 1º de Maio, tinha assistências inferiores comparando com os dias de hoje. O Euro 2004, além de trazer estádios novos, aproximou também mais gente para o futebol, e na cidade de Braga manteve-se essa aproximação devido ao crescimento a olhos vistos do clube. As épocas foram-se superando sucessivamente e o Braga foi cativando cada vez mais adeptos, os que já eram trouxeram os amigos, que também ficaram adeptos e convidaram outros para vir, outros ainda por iniciativa própria fidelizaram-se ao clube. Tornou-se moda na cidade ir ao futebol, e ser do Braga é "fixe", porque o Braga ganha, porque o Braga vai à UEFA, porque o Braga dá nas noticias da tv, porque o Braga é falado por todo o lado e enche o peito de orgulho a todos os que entraram na moda. Mas nenhuma moda dura para sempre, e aí eu pergunto, e se o Braga tiver uma época menos boa? E se o jornais em vez de falarem no sucesso de o Braga se ter qualificado para a Taça Uefa falar no desaire de o Braga apenas ter conseguido a qualificação para a Taça Uefa? Continuará a ser moda ir ao futebol? Será ainda "fixe" ser do Braga? Não creio... Cada vez se sente mais a falta de fervor, de raça, de clubismo, de sofrimento... E se um dia a moda passa, só estes vão restar para preencher as cadeiras da Pedreira...

[LeonelP]

Nao tenho nada a comentar. Simplesmente acho o artigo fantastico. Nao e' facil encontrar temas deste genero aplicados ao futebol. Parabens

[Mafalda]

Como fã de Descartes não li o seu Erro...
Adorei o texto, está fantástico!


O futebol ou é vivido com paixão ou não vale a pena!

[cardoso]

Como fã de Descartes não li o seu Erro...

Este é melhor:
http://cardosogomes.com.sapo.pt/aoencontrodeespinosa.htm
"Os sentimentos de dor ou prazer são os alicerces da mente" ... delicioso.

desculpem o off

[PAF]

Por acaso o meu irmão contou-me uma reportagem do jet set (actores, modelos e coisa do genero) que form ver o EURO de futsal, lá foram de BUS paga, viagem paga e por aí fora, e os jornalistas fizeram-lhes perguntas sobre futsal... resultado nem sequer sabiam quantos jogadores tinha uma equipa, se podia haver substituições e por aí fora!

[cardoso]

Mas isso não é necessariamente mau, PAF. Quem dera que a moda pegasse mesmo.
Amigos, a paixão não nasce do nada!!!!

[PAF]

Mas isso não é necessariamente mau, PAF. Quem dera que a moda pegasse mesmo.
Amigos, a paixão não nasce do nada!!!!

Eu referi não por seu mau...mas porque é muito "in", eles só foram porque havia alguém que os convidou, logo se alguém os convidou é porque achou que trazia algo positivo para o jogo... a verdade é que trouxe, foi mais uma reportagem que se fez sobre o EURO

[djfc]

Nao tenho nada a comentar. Simplesmente acho o artigo fantastico. Nao e' facil encontrar temas deste genero aplicados ao futebol. Parabens

idem

[braga2007]

Creio que um adepto de futebol deve ser mais emocional do que racional, afinal o futebol é "apenas" um jogo, que nós levamos talvez demasiado a sério, onde descarregámos todas os nossos sentimentos. Não se pode racionalizar o futebol, e é isso que está a ser feito, fazendo do futebol uma indúistria, cada vez mais inacessível aos verdadeiros adeptos, os emocionais, os que o encaram como algo de vida ou morte.

[1]

Eu no que toca ao Braga sou 90% emoção 10% razão. Na selecção igual. De resto a ver futebol sou bastante racional e sei ver o jogo e não ser "toldado" pela emoção.

Por isso é que podendo pagar ia sempre ver este jogo ao contrario de ti (pelos vistos) Cardoso. Porque vivo o Braga com muita mais paixão do que razão o que me faz estar lá sempre 

[cardoso]

Eu no que toca ao Braga sou 90% emoção 10% razão. Na selecção igual. De resto a ver futebol sou bastante racional e sei ver o jogo e não ser "toldado" pela emoção.

Por isso é que podendo pagar ia sempre ver este jogo ao contrario de ti (pelos vistos) Cardoso. Porque vivo o Braga com muita mais paixão do que razão o que me faz estar lá sempre 

Pois, 1, são os 10% de razão a funcionar: se não tivesse tido reunião, à ultima hora era bem capaz de me arrepender de  não ir. Mas a razão mostra-me que 20 euros é uma exploração. Não se trata aqui de dizer que 20 euros se gastam nisto e naquilo, que por vezes gastamos em coisas menores, etc e tal. Trata-se aqui de um gesto simbólico: se não concordo e alinho numa coisa, estou a ser hipócrita. E isso é das coisas que mais abomino - a hipocrisia.
Mas atenção: respeito TOTALMENTE quem pensa de outra forma e até fiquei contente por ver que estava lá mais gente do que eu esperava.
Mas a vida é mesmo assim: andamos sempre a dançar entre o racional e o emocianal. No entanto, estes 43 anos de vida ensinaram-me uma coisa: o emocional é muito mais divertido que o racional.

[Maria]

Eu costumo dizer que gosto mais do Braga do que de futebol...
Quanto ao ser "in" ir a um jogo de futebol, pode ser que com o tempo traga mais adeptos. Não tem necessariamente que ser mal.
Depois do Euro2004 acho que vejo ainda mais mulheres no futebol p.ex.
E este fim de semana 10.000 foram ver os Lobos em rugby... será que toda a gente percebe as regras?!