artigo DM - VENHA DE LÁ O CACETE

[cardoso]

Vai finalmente começar o Campeonato do Mundo. As janelas já estão engalanadas com a bandeira da ditosa Pátria, o cachecol já está junto ao vidro traseiro do carro, só é pena que caia em desuso aquela moda catita de embrulhar o encosto de cabeça do banco dianteiro com uma bandeirinha vermelha e verde. Enfim, já somos outra vez todos por um. Só a selecção seria capaz de quebrar o (des) encanto da vitória do Porto no Campeonato e na Taça, de fazer esquecer a tragédia de quem desceu de divisão, de desprezar os milhões de prejuízo que vão pelas contas das SAD's e clubes. Mas a equipa de todos nós consegue muito mais do que isso.
Se não fossem os nossos heróis, já repararam na pasmaceira que iria pelos jornais desportivos? Onde estão as parangonas dos contratos virtuais que os tais "grandes" costumam fazer por esta época? Nas manchetes já não há escândalos nem entrevistas incendiárias, já não há contratações fabulosas e não é só porque está tudo "teso como um carapau". É também e principalmente porque vai haver futebol a valer. No entanto não são só os jornais que ficam a ganhar com esta febre.
Os nossos políticos, por exemplo, estarão nas próximas semanas como peixes na água. Vão assim poder justificar uma resma de faltas na Assembleia da República, em apetitosos "trabalhos políticos relevantes" nas bancadas dos estádios germânicos. Mais ainda: agora, desça ou suba o preço do petróleo, podem aumentar os impostos, inventar taxas e descer ordenados que ninguém dá por nada! Até os professores poderão agora ser espezinhados com (ainda) mais fervor, porque estão todos entretidos, de bandeirinha na mão, a festejar os golos do Pauleta! É o paraíso de quem (des) governa! Viva o futebol! Até os incêndios se anteciparam à festa; lá para os lados de Barcelos, como se não bastasse a inacreditável descida do Gil Vicente na Secretaria, veio agora o terrorismo à portuguesa destruir a floresta de Fragoso, mau grado os magníficos meios aéreos que vieram assistir ao rescaldo, ao fim de três dias de fogo.
Não, caro leitor, isto não é fugir ao assunto. Eu sei que estou aqui para falar da bola mas a bola é como o bacalhau: vai bem com tudo e tem a ver com tudo. Está aí a selecção para o provar: podem vossas excelências nem saber quantos jogadores tem uma equipa, mas neste mês vão sofrer como nós, os doentes da bola, para saber o que dói. Não, não se iludam que nem gostam de futebol, que não percebem nada disso ou que têm a loicinha para lavar, ou que o futebol é coisa para atrasados mentais, etc. etc. deixem-se dessas banalidades e desiludam-se, meus amigos, porque nem vocês escaparão aos terríveis vírus da selecção e do patriotismo. Durante coisa de um mês, vocês, os sábios que não ligam à bola, serão como nós, os que não sabemos quanto custa um barril de petróleo; os ignorantes que nos esquecemos do nome da sábia e visionária Ministra da Educação; nós, os da bola, cujos conhecimentos sobre a política educativa portuguesa não vão além da velha e sábia máxima "a culpa é do professor". Mas uma coisa é certa e sabida: se não ficarem a saber quem é o Maniche, não serão nunca bons portugueses. E nós sabemos a "linha" toda de cor!
O pior é que a crise está aí. Por todos os lados. No entanto acaba hoje. Ou melhor: ainda pode sobreviver até domingo, mas quando entrar em campo a selecção das quinas, meus amigos, no próximo domingo, este país será o mais culto do Mundo, o mais bem governado, o mais feliz!
Bem, bem vistas as coisas, um pouco de ópio até nem faz mal a ninguém; as coisas já andam tão mal que só poderão piorar nos próximos tempos, portanto o melhor mesmo é que nós nos atiremos de cabeça para as profundezas do mundo bola, que nos afundemos com 50 quilos às costas para o reino de Scolari porque não há nada como uma boa anestesia para podermos continuar as levar as cacetadas com que temos sido brindados nos últimos tempos. Venha de lá o cacete que nós queremos é golos, cerveja a rodos e carros a apitar pela rua até de madrugada!

[ZGANDULO]

 










O melhor mesmo é rir porque chorar nesta altura e como diz o CARDOSO....

[joao da cal]

Sim, de facto o euro 2004 foi uma anestesia altamente! Festas quase todos os dias! Pelo menos isso, no meio de tantas noticias desagradáveis, como as de hoje da subida das taxas de juro...

[Vlad]

Quando li o título do tópico, pensei: "É lá!!!!!!! Que o Cardoso ficou tolo!!!!" 
Dá para muitas interpretações!!!! 

Quanto ao texto, excelente!

[xpt_nautilus]

Ha dois gajos neste forum que eu ainda nao conheço mas tenho uma grande admiraçao por eles, sao o Ze e o Cardoso. Espero que durante muitos anos continuem a postar neste forum, porque isto sem eles nao é a mesma coisa.

Quanto ao assunto em questao concordo em absoluto.

[1]

Quando li o título do tópico, pensei: "É lá!!!!!!! Que o Cardoso ficou tolo!!!!" 
Dá para muitas interpretações!!!! 

Quanto ao texto, excelente!

Tb pensei o mesmo.

Concordo quanto ao texto, muito bom 

[braguista365]

muito bom texto! muitos muitos parabens ,ha redatores de jornais portugueses que deveriam por os olhinhos em textos como este para aprender alguma coisa! 

[Pé Ligeiro]

Seu grande corporativista! Não te imaginava tão cáustico em relação aos actuais inquilinos do edifício da Rua Professor Gomes Teixeira em Lisboa.
Compreendo perfeitamente esse mal estar que se faz sentir em tão nobre e ao mesmo tempo, mal amada classe, responsável pela transmissão do saber. Conheço de perto esse mal estar e acho que já se foi longe demais.
Relativamente ao restante conteúdo, acho-o muito apropriado, embora eu esteja mais optimista.

Não vale a pena repetir muito aquilo que já é um lugar comum, mas por vezes é bom lembrá-lo: é que o "nosso professor" que sempre se pautou por prosas ricas em conteúdo, ultimamente tem vindo a refinar essa qualidade, elevando assim o nível do fórum e cumulativamente, dignificando a classe a que pertence.

[weasel]

Peço desculpa ao Cardoso, por esta citação seguinte, mas como ele diz o futebol (desporto) é como o bacalhau...
De qualquer maneira, a forma redutora como se vem tratando da educação em Portugal é a todos os níveis inademissível! É a democracia a derrubar as suas próprias fundações...

OS professores andam em pé de guerra. Como os professores são normalmente distantes uns dos outros, os seus pés de guerra andam por aí semeados como pés de salsa, espalhados pelo País. De norte a sul. Os professores estão descontentes. Com a vida que lhes corre mal, porque ninguém os valoriza; com os colegas, que só se interessam por resolver a sua vidinha; com os alunos, que os desconsideram e maltratam; e, acima de tudo, com o Governo da nação, que os desvaloriza, os desautoriza e os desmoraliza. Nunca fui um estudante fácil e sabia que um professor desautorizado era um homem (ou uma mulher) morto na escola. Não quero dizer fisicamente mas profissionalmente. Como sempre fui bom observador, conhecia de ginjeira os professores fortes e os professores fracos.
Os fortes resolviam, por si próprios, a questão. Alguns pela autoridade natural do seu saber e da sua atitude, outros de forma menos académica. Os fracos eram defendidos pelos reitores. Ir à sala de um reitor era, já por si, um terrível castigo. Mas bem me lembro que professores fracos e fortes, bons e nem por isso, se protegiam, se defendiam e se reforçavam na sua autoridade comum. Já nesse tempo se percebia que tinha de ser assim, porque, se não fosse, os pais comiam-nos vivos e davam-nos, já mastigados, aos filhos relapsos. E isso a escola não consentia. Os pais, dito assim de forma perigosamente genérica, sempre foram entidades pouco fiáveis em matéria de juízo sobre os seus filhos e, por isso, sobre quem deles cuida, ensina e faz crescer. Os pais sempre foram o pavor dos professores de natação, dos técnicos do futebol jovem, dos animadores das corridas de rua. Os pais, em casa, acham os filhos umas pestes; mas na escola, no campo desportivo, no patamar da casa do vizinho, acham os filhos virtuosos e sábios. Os pais são, individualmente, insuportáveis e, colectivamente, uma maldição. Claro que há pais... e pais. E vocês sabem que não me refiro aos pais a sério, que são capazes de manter a distância e o bom senso. Falo dos outros, dos pais e das mães que acham sempre que os seus filhos deviam ser os capitães da equipa e deviam jogar sempre no lugar dos outros filhos. O trágico disto tudo é que são precisamente esses pais os que, na escola, se acham verdadeiramente capazes de fazer a avaliação, o julgamento sumário dos professores dos seus filhos, achando que eles só servem para fazer atrasar os seus Einsteinzinhos. Por isso eu aqui me declaro a favor dos professores. Quero jogar na equipa deles contra a equipa dos pais e ganhar o desafio da vida real e do futuro deste país contra o desafio virtual dos pedagogos de alcatifa.

[FIDELIS]

só uma palavra


BRILHANTE

Fidelis Bracara
Braga e Basta

[cardoso]

Meus amigos, muito obrigado pelas vossas palavras . Corro até o risco de ficar vaidoso, que é coisa que detestava ser...
Vocês contam...

Amigo weasel, podes dizer quem escreveu esse texto? Está excelente!!!

[weasel]

Meus amigos, muito obrigado pelas vossas palavras . Corro até o risco de ficar vaidoso, que é coisa que detestava ser...
Vocês contam...

Amigo weasel, podes dizer quem escreveu esse texto? Está excelente!!!

Vou dizer-te mas nem vais acreditar... o autor do texto é o Vitor Serpa...

De qualquer maneira, tem havido bons escritos sobre este assunto da educação em Portugal!! Pena é k muitos não os leiam e nao sejam realçados pela CS... Assim, o povinho acredita na demagogia o ME e continua cegamente a comer os decretos, as leis e as medidas que de lá vêm!!!

[Zé]

Mais um texto brilhante do Ernest... Não canso de repetir que escrever a este nível é só para alguns. Escrever um texto é fácil... escrever dois textos é fácil... mas consecutivamente escrever a este nível é muito difícil. Sobre o Cardoso está tudo dito. Não se pense que estou a dar graxa - não sou desses- pelo contrário,  quantas vezes lhe telefono a discordar de pormenores...Subscrevo o XPT e na parte que me toca, acho que exagera nitidamente. Adiante...

Subscrevo texto...
Curioso que hoje li no DM duas notícias curiosas. Uma dava conta que na Croácia, quase metade da população activa não vai trabalhar nos dias dos jogos da Croácia. Uns vão ficar doentes e outros meteram férias.
Na China, uma agência de viagens implantou um pacote turístico, intitulado de "Víuvas do Mundial"  para as esposas daqueles que largam tudo para ver os jogos... Chego à conclusão que a "anestesia" provocada pelo futebol não é típica dos portugueses.
Será que há razões para "largar" tudo pelo futebol?
Será que a paixão, emoção, provocada pelo futebol, é reprovável?
Que dizem?

[cardoso]

o autor do texto é o Vitor Serpa...

isto vem na Borla? Incrível. O Serpa subiu muito na minha cotação.

Será que há razões para "largar" tudo pelo futebol?
Será que a paixão, emoção, provocada pelo futebol, é reprovável?

Não para as duas perguntas.
largar tudo pelo futebol é fanatismo cego. Há vida para lá do futebol.
Mas uma paixão nuca é reprovável. Muitos dizem que é a inteligencia que faz andar o mundo. Outros dizem que é Deus, outros ainda dizem que são as guerras que trazem o progresso. Talvez não seja nada disso; talvez seja tudo isso e mais uma caisa: a paixão.

[ZGANDULO]

Não para as duas perguntas.
largar tudo pelo futebol é fanatismo cego. Há vida para lá do futebol.
Mas uma paixão nuca é reprovável. Muitos dizem que é a inteligencia que faz andar o mundo. Outros dizem que é Deus, outros ainda dizem que são as guerras que trazem o progresso. Talvez não seja nada disso; talvez seja tudo isso e mais uma caisa: a paixão./ AMBIÇÃO

Sem a ambição a vida cai na monotonía, desmorana-se e quando alguêm acorda resolve fazer uma guerra, Amigo CARDOSO!!!

[Mafalda]

Parabéns pelo texto, mais uma vez está excelente.

Concordo com o que foi dito, isso é sinal de um país deprimido e sem esperança, é urgente agarrarmo-nos a algo que nos dê alegrias, vontade de acordar, enfrentar as notícias desoladoras, etc, típico de 3.º mundo. Não há muito tempo pensava que isso só acontecia com o Brasil, aquele mais mediático, em que tudo parava para festejar cada vitória, apesar de metade ou mais estar com fome. Eu vou mais além do ópio, ou melhor recuo mais no tempo, "pão e circo".

Claro que não estou a criticar, só a analisar e é verdade que grandes(ou pequenas) medidas vão ser tomadas, muitos assuntos importantes vão estar em discussão pública, mas que importa? Portugal está no Mundial!

E agora os professores!  Pois é, não sou professora, mas sou mãe, sou educadora e até concordo que os professores estejam descontestes, revoltados mm, mas eu tb estou como mãe, com a educação, o sistema ( lá está, parece futebol  ), mas de quem é a culpa?? Foram as sucessivas reformas feitas por teóricos, por iluminados de gabinete, os cursos a abarrotar de gente a quem o ensino nada lhes diz, a não ser a possibilidade de não ficar de fora do ensino superior; os pais, é verdade, que perderam o controlo dos seus filhos, perderam a clara noção que a escola não educa sozinha.

A educação, de facto, é como o futebol, dá discussões sem fim, desperta paixões e ódios, vai muito além do que aqui se possa transmitir.